Pagu!

Nestes 100 anos da Semana de Arte Moderna, é importante ressaltarmos a contribuição milionária que deu pra arte brasileira e pro povo brasileiro. Antes, alguns autores, como o genial Lima Barreto, tinham criado uma literatura única, incontornável pra entender o nosso país e pra construirmos um país que seja do povo. Um país com a lindeza dos seus escritos. Mas o evento no Theatro Municipal de São Paulo, em fevereiro de 1922, condensou a idéia de que a arte precisa se livrar do tecnicismo e sair da torre de marfim pra brilhar como sol no peito das pessoas (in)comuns. Como disse o Oswald de Andrade no Manifesto da Poesia Pau Brasil, nossa poesia precisa(va) da contribuição milionária de todos os erros. É nóis! Pra poder escrever pra, em vez de para, apelido, em vez de nome pomposo. E o poema ser ao mesmo tempo a mais banal das conversas na rua, a mais carinhosa canção de ninar no recanto do lar e a mais dourada récita no Theatro Municipal. A Semana de Arte Moderna também condensou a idéia de que precisamos de uma arte nossa. Que essa arte pode (e até deve) aproveitar a contribuição também milionária de artes de outros, mas que, como disse (ó nóis aqui travêiz) o Oswald de Andrade no Manifesto Antropófago, devemos mastigar essas influências, como goma de mascar misturada com as nossas palavras, pra criarmos palavras ainda mais nossas, como futebol, que fez um golaço ao driblar magistralmente o foot-ball, deixando-o no chão, com a espinha entortada. Tupi or not tupi, eis a questão!

Soloswald, como o chamou o Gilberto Felisberto Vasconcellos, ele próprio um Soloswald.

“Eu insulto o burguês! O burguês-níquel, o burguês-burguês! A digestão bem feita de São Paulo!”. Em sua Ode ao burguês, o Mário de Andrade expôs que uma arte brasileira precisa ter lado. O lado do povo. Contra o burguês. Sob pena de, se assim não for, ser, mesmo que sublime, uma jóia burguesa anti-povo. A grana do café oligárquico paulista, da capital do capital no Brazil, que bancou a Semana de Arte Moderna, segue a linha de buscar prestígio em várias frentes, de seduzir o espelho-espelho meu pra que lhe diga sempre, mesmo quando seriamente em dúvida, que é a mais bela, de transformar tudo em mercadoria. Mas a Semana de 22, ainda que sucumbindo em parte à lógica “da força da grana que ergue e destrói coisas belas”, conseguiu indiretamente, ao ir em busca do povo brasileiro, criar a Petrobrás, pra ser a executora do (incompleto) monopólio estatal do petróleo. Desde 1953 (e antes), a questão continua soloswaldiana: Tupi or not Tupi. Agora no petróleo (do Pré-Sal e além). Cadê a versão petroleira da Ode ao burguês? Cadê?!

Essa versão está na periferia ocupando o Theatro Municipal da energia que é a Petrobras e reescrevendo Petrobrás, o acento como a bandeira que Mané agita contra os privatistas e todos os tecnocratas que utilizam Petrobras como um disfarce pra Shell e outras oilgarcas. Mas não apenas ocupando. Também mascando essa goma pra recriá-la povão. Neologismo político a derrubar todas as imperialistas torres de marfim.

Cristão ou pagão? Não importa. O importante é Pagu!

Antony Devalle é trabalhador da Petrobrás e integrante do grupo autônomo de trabalhadores petroleiros Inimigos do Rei. É um dos fundadores e editores do Portal Autônomo de Ciências.

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